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STF suspende julgamento sobre marco temporal indígena e sessão será retomada nesta quinta-feira

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nessa quarta-feira o julgamento sobre o marco temporal na demarcação de terras indígenas — o mais importante processo sobre o tema — com as manifestações das quatro partes envolvidas no processo e de 21 das 35 instituições interessadas na ação. A sessão foi suspensa e o voto do relator, ministro Edson Fachin, assim como a continuação das sustentações orais, ficaram para esta quinta-feira.

O marco temporal chegou ao STF por meio de uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem indígenas Guarani e Kaingang.

O que se discute na ação é saber se, para o reconhecimento de uma área como território indígena, é necessária a comprovação de que os indígenas ocupavam a terra no momento da promulgação da Constituição de 1988. Ao todo, 84 processos que tratam do mesmo tema estão suspensos e aguardam um desfecho do Supremo.

Representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o advogado Luiz Eloy Terena apontou para a inconstitucionalidade da tese do marco temporal para a demarcação das terras indígenas.

— Adotar a tese do marco temporal é ignorar todas as violações que os povos indígenas estão e estiveram submetidos. É preciso reafirmar que a proteção constitucional dispensada às terras indígenas é um compromisso de Estado. Sendo assim demarcar terra indígena é um imperativo constitucional —, afirmou.

Ao falar pela Associação Juízes pela Democracia, a subprocuradora-geral da República aposentada Déborah Duprat argumentou que a tese do marco temporal pressupõe indígenas sem terra e rompe os principais pilares da Constituição.

— A Constituição de 88 inaugura uma sociedade plural, onde a ideia de assimilação tem que ser afastada, porque é uma ideia de supremacia racial. Os povos indígenas são sujeitos de direito plenos, mas para isso, precisam de seus territórios —, ressaltou.

A Advocacia-Geral da União (AGU), que representa os interesses do governo federal, defende que uma mudança na tese do marco temporal “tem o potencial de gerar insegurança jurídica e ainda maior instabilidade nos processos demarcatórios” e pede que o marco seja mantido “em prol da pacificação social”.

A manifestação do advogado-geral da União, Bruno Bianco, aponta que o entendimento firmado pelo STF no caso Raposa Serra do Sol “estabeleceu balizas e salvaguardas para a promoção dos direitos indígenas e para a garantia da regularidade da demarcação de suas terras. Como regra geral, foram observados o marco temporal e o marco da tradicionalidade, salvo em caso de esbulho renitente por parte de não-índios”.

A AGU argumentou que a demarcação de terras indígenas é um procedimento complexo no âmbito da Administração Pública, que termina com a homologação por ato do Presidente da República e inscrição no registro imobiliário.

“Portanto, apenas com a finalização do procedimento demarcatório é que serão iniciados os atos atinentes ao levantamento de ocupações não indígenas e apuração das benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé. Ou seja, até que se ultimem os atos de regularização fundiária, com a especificação dos limites da reserva indígena e a indenização pelas benfeitorias feitas por ocupantes de boa-fé, estes ainda exercem posse legítima sobre a área”, disse.

Também se manifestou de maneira favorável ao marco temporal o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina, uma das partes envolvidas no processo, para quem os proprietários de terras não podem ser expulsos de suas propriedades sem que haja formação completa de que aquele espaço é uma terra indígena tradicional.

— Não se pode violar outros direitos fundamentais igualmente relevantes à sociedade brasileira. Precisamos proteger os direitos territoriais indígenas? Óbvio que sim. Mas devemos também proteger os direitos dos empresários e agricultores de Santa Catarina —, defendeu o procurador de Santa Catarina Alisson de Bom de Souza.

A sessão de julgamentos nesta quarta-feira foi acompanhada, do lado de fora do STF, por representantes de povos indígenas que estão acampados em Brasília desde a última semana. A mobilização deve seguir para a continuação do debate nesta quinta, na expectativa pelo voto do relator. Caso a análise não seja concluída, há o receio de que os indígenas permaneçam em Brasília e se encontrem com apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que participarão de atos convocados para o feriado de 7 de Setembro.

Fonte: O Globo