Conafer saltou de R$ 458 mil para R$ 96 milhões em arrecadação após intervenção política na autarquia previdenciária.

A Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer) deveria ter sido expulsa do sistema de descontos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 2020. A entidade se recusava a apresentar documentos de filiação de aposentados e estava sob investigação interna por irregularidades. No entanto, uma intervenção do governo Jair Bolsonaro salvou a confederação do descredenciamento, permitindo que ela se tornasse uma das maiores beneficiárias do esquema fraudulento que drenou bilhões de reais de aposentados.
O processo de rescisão do acordo da Conafer com o INSS havia sido iniciado pela Diretoria de Benefícios da autarquia, que identificou irregularidades na apresentação de fichas de filiação e associação de aposentados. A medida impediria a confederação de continuar descontando valores das aposentadorias. Contudo, em uma reviravolta suspeita, a entidade foi resgatada pelo governo federal, que transferiu a gestão dos acordos para outra diretoria, facilitando a manutenção do convênio.
A mudança administrativa ocorreu durante a gestão de Leonardo Rolim, que assumiu a presidência do INSS em 2020, substituindo Renato Rodrigues Vieira. Enquanto Vieira havia criado uma diretoria de integridade e endurecido os critérios de fiscalização, Rolim promoveu alterações que beneficiaram entidades sob suspeita. A transferência da gestão dos acordos da Diretoria de Benefícios para a Diretoria de Atendimento foi apresentada como racionalização do serviço, mas na prática facilitou a continuidade das operações fraudulentas.
O crescimento da arrecadação da Conafer após o “resgate” foi vertiginoso. A confederação saltou de R$ 458 mil em 2019 para R$ 59 milhões em 2020, tornando-se a segunda entidade que mais descontava valores de aposentadorias no país. Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, a Conafer já embolsava mais de R$ 96 milhões, consolidando-se como vice-campeã nacional em descontos de aposentados do INSS.
A reação da Conafer às investigações teria incluído intimidação a servidores públicos. Quando notificada pelo INSS em agosto de 2020 para se defender das acusações de desconto ilegal, a confederação não apresentou defesa técnica. Em vez disso, dois servidores responsáveis pela fiscalização relataram ter recebido mensagens anônimas contendo fotos e endereços de suas famílias, caracterizando uma tentativa de coação.
As suspeitas sobre a Conafer se intensificaram com denúncias de corrupção envolvendo sua cúpula. Um empresário que teve prejuízos com a confederação prestou depoimento à Polícia Civil afirmando que a entidade falsificava documentos e que seu presidente, Carlos Roberto Lopes, alegava ter “domínio sobre os diretores do INSS” e realizava “repasse de vantagens financeiras”. Esta foi a primeira denúncia direta de pagamento de propina a integrantes da direção da autarquia previdenciária.
O esquema de fraudes no INSS, que começou em governos anteriores, ganhou proporções alarmantes durante a gestão Bolsonaro. Apesar de medidas iniciais para combater irregularidades, como a exigência de revalidação anual de filiações, as regras foram posteriormente afrouxadas no Congresso Nacional. A Justiça do Distrito Federal negou pedidos de quebra de sigilo bancário da Conafer, e tanto a confederação quanto o ex-presidente do INSS teriam se recusado a comentar as acusações.
Com informações do portal Revista Piauí.