Ações de Trump que causariam indignação na extrema-direita brasileira se fossem de Lula

Presidente americano, considerado modelo pela extrema-direita brasileira, adota medidas autoritárias que incluem ameaças à imprensa, controle de redes sociais e perseguição a opositores.

Imagem: Reprodução

Donald Trump é amplamente celebrado pela extrema-direita brasileira como um governante modelo, inspirando discursos e práticas políticas de líderes conservadores no país. Seus métodos de comunicação direta, ataques sistemáticos à imprensa tradicional e postura antissistema são frequentemente elogiados por setores que se identificam com sua retórica populista de direita.

Essa admiração, no entanto, revela uma contradição fundamental quando analisadas as práticas autoritárias que o presidente americano vem implementando em seu segundo mandato. As mesmas ações que são aplaudidas quando vindas de Trump provavelmente seriam denunciadas como ditatoriais se partissem de líderes de esquerda como Lula.

O desprezo de Trump pela liberdade de imprensa atingiu um novo patamar quando o presidente ameaçou cassar as licenças de transmissão da NBC e ABC, duas das principais emissoras de televisão dos Estados Unidos. Em postagem no Truth Social, Trump chamou as redes de “duas das piores e mais tendenciosas da história”.

O presidente defendeu que a Comissão Federal de Comunicações revogue suas concessões, justificando a ameaça ao alegar que as emissoras publicam “97% de histórias ruins” sobre seu governo. Segundo Trump, ele está vivendo “entre os maiores oito meses da história presidencial”, o que tornaria a cobertura negativa injustificável.

Em tom agressivo, Trump declarou ser “totalmente a favor” da cassação das licenças, classificando as emissoras como “braço do Partido Democrata” e “uma ameaça real à nossa democracia”. Essa retórica representa uma escalada sem precedentes no confronto entre o poder executivo americano e a imprensa livre.

O governo Trump implementou uma política de vigilância digital sem precedentes ao exigir que estudantes estrangeiros mantenham suas redes sociais em modo público para obter vistos americanos. A medida, anunciada pelo Departamento de Estado em junho, determina que solicitantes de vistos das categorias F, M e J tenham seus perfis rastreados por diplomatas americanos.

O objetivo declarado é identificar posts ou mensagens consideradas hostis aos Estados Unidos ou sua cultura. A triagem digital inclui não apenas publicações públicas, mas também mensagens privadas e histórico completo de atividade online dos candidatos.

Essa política configura um sistema de monitoramento que viola princípios básicos de privacidade e liberdade de expressão, criando um precedente perigoso para o controle estatal sobre comunicações digitais. A Embaixada americana recomenda que os candidatos configurem seus perfis como públicos previamente, evidenciando como a medida força uma autocensura preventiva.

A relação de Trump com o Poder Judiciário revela um padrão sistemático de desrespeito às instituições democráticas. Análise de 165 processos judiciais mostra que o presidente e seus aliados desrespeitaram uma a cada três decisões contrárias ao governo, estabelecendo um precedente grave de desobediência institucional.

Trump escalou ataques pessoais contra juízes via redes sociais, questionando não apenas suas decisões, mas também sua autoridade e legitimidade. O presidente chegou a impor sanções a juízes do Tribunal Penal Internacional e intensificou críticas sempre que decisões judiciais contrariaram sua agenda política.

Essa estratégia representa uma tentativa sistemática de minar a confiança no sistema judiciário, utilizando a popularidade presidencial para deslegitimar o controle constitucional exercido pelos tribunais. A Casa Branca passou a reagir de forma cada vez mais agressiva a decisões desfavoráveis, numa escalada que visa enfraquecer a independência judicial.

As universidades americanas se tornaram alvo de uma campanha sistemática de perseguição política por parte do governo Trump. O presidente ameaçou encerrar o financiamento federal para instituições que permitam “protestos ilegais”, numa referência direta às manifestações pró-palestinas que eclodiram nos campi universitários.

Essa política representa uma instrumentalização do orçamento federal como ferramenta de controle ideológico sobre a educação superior. A repressão universitária inclui detenção e deportação de estudantes estrangeiros por ativismo político, além de cortes em programas de diversidade, equidade e inclusão.

O governo também revogou milhares de vistos de estudantes internacionais e estabeleceu taxas adicionais para desencorajar a vinda de acadêmicos estrangeiros. Essas medidas comprometem a tradicional capacidade americana de atrair pesquisadores e estudantes internacionais, isolando o país academicamente.

O controle da informação se estende além das ameaças às emissoras, com Trump estabelecendo acordos milionários com conglomerados de mídia em processos por difamação. Em julho, o presidente fechou um acordo de 16 milhões de dólares com a CBS News, seguido por outro de 15 milhões com a ABC.

Paralelamente, o presidente da Comissão Federal de Comunicações, republicano Brendan Carr, abriu investigações sobre programas de diversidade da Comcast e sobre a relação da NBC com suas afiliadas locais. Essa coordenação entre diferentes instâncias governamentais evidencia uma estratégia ampla para pressionar a mídia.

Essas ações de Trump ecoam práticas historicamente associadas a regimes autoritários e representam uma ruptura com tradições democráticas americanas. Pesquisas recentes do instituto The Economist/YouGov mostram que 56% dos americanos desaprovam a condução da presidência, indicando que as táticas repressivas não encontram respaldo popular.

O paradoxo reside no fato de que a mesma extrema-direita brasileira que aplaude essas medidas quando vindas de seu “governante modelo” provavelmente as denunciaria como “ditatoriais” se fossem implementadas por Lula ou qualquer líder de esquerda. A seletividade do discurso revela como a defesa da democracia, para alguns setores, está subordinada a alinhamentos ideológicos, evidenciando a fragilidade dos compromissos democráticos quando conveniências políticas estão em jogo.

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